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A trégua

Autor

Mario Benedetti

Editora

Brasiliense

Tradução

Mustafa Yazbek

Reunião de Diretoria

“ ... Sábado, 17 de agosto

Pela manhã estive falando com dois membros da Diretoria. Coisas sem maior importância, mas que foram suficientes, no entanto, para me fazer entender que têm por mim um amável, compreensivo desprezo. Imagino que eles, quando se refestelam nas poltronas fofas da sala da Diretoria, devem sentir-se quase onipotentes, pelo menos tão perto do Olimpo como pode chegar a sentir-se uma alma sórdida e obscura. Chegaram ao máximo. Para um futebolista, o máximo significa um dia integrar a seleção nacional; para um místico, comunicar-se alguma vez com seu Deus; para um sentimental, encontrar em alguma oportunidade, em outro ser, o eco verdadeiro de seus sentimentos. Para essa pobre gente, em troca, o máximo é chegar a sentar-se nas poltronas da Diretoria, experimentar a sensação (que para outros seria tão incômoda) de que alguns destinos estão em suas mãos, ter a ilusão de que resolvem, de que dispõem, de que são alguém. Hoje, no entanto, quando eu os olhava, não podia encontrar neles o rosto de Alguém, mas sim de Algo. A mim parecem Coisas, não Pessoas. Mas, o que lhes parecerei eu? Um imbecil, um incapaz, um farrapo que se atreveu a rechaçar uma oferta do Olimpo. Uma vez, há muitos anos, ouvi o mais velho deles dizer: "O grande erro de alguns homens de empresa é tratar seus empregados como se fossem seres humanos". Nunca esqueci e nem esquecerei essa frasezinha, simplesmente porque não posso perdoá-la. Não somente em meu nome, mas em nome de todo o gênero humano. Agora sinto a forte tentação de inverter a frase e pensar: "O grande erro de alguns empregados é tratar seus patroes como se fossem gente". Mas resisto a essa tentação. São pessoas. Não parecem, mas são. E pessoas dignas de uma odiosa piedade, da mais infamante das piedades, porque a verdade é que possuem uma casca de orgulho, um repugnante porte, uma sólida hipocrisia, mas no fundo são ocos. Asquerosos e ocos. E padecem da variante mais terrível de solidão: a solidão de quem nem tem a si próprio.

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