Criaturas de um dia
Autor
Irvin D. Yalom
Editora
HarperCollins Brasil
Tradução
Ivo Korytowski
A doença do século: a explicação
“... Paul retrucou em sua carta seguinte: “Dada a escolha entre viver e examinar, optarei por viver qualquer dia. Rejeito a doença da explicação e insisto que faça o mesmo. O impulso por explicar é uma epidemia no pensamento moderno, e seus maiores disseminadores são os terapeutas contemporâneos — todo terapeuta que conheci sofre dessa doença, que é viciadora e contagiosa. A explicação é uma ilusão, uma miragem, um constructo, uma canção de ninar reconfortante. A explicação não tem existência. Chamemo-la pelo nome apropriado: a defesa de um covarde contra o terror — que deixa paralisado e de pernas bambas —, a precariedade, a indiferença e a inconstância da mera existência. “
A doença que mostra a morte e depois devolve para a vida
“... “Outras pessoas, algumas também com câncer, me dizem: ‘Você vai viver trinta anos.’ Elas dizem a si próprias: ‘Não vou morrer disso.’ Até Nancy, do meu grupo de apoio, tão sábia e lúcida, escreveu num e-mail ontem: ‘Nossa esperança é sobreviver o bastante para que tratamentos mais eficientes sejam desenvolvidos.’ Não é isso, entretanto, que quero ouvir. Essa é uma ideia ilusória. Não importa se vou viver muito ou pouco tempo; o que importa é que estou viva agora. Quero ouvir que existem outras coisas com que me preocupar além de quantos anos vou viver. Quero ouvir que não tenho de dar as costas aos pensamentos sobre sofrimento ou morte, mas que também não tenho de dispensar tempo demais para eles. Quero aceitar que a vida é temporária e, à luz (ou à sombra) desse conhecimento, saber vivê-la. Viver agora. O câncer nos mostra a morte e depois nos devolve para o mundo, para a vida, para todos os prazeres e as doçuras, que sentimos bem mais intensamente do que antes. Sabemos que algo foi dado e que algo foi retirado.”
“Algo foi dado e algo foi retirado.” Eu sabia o que Ellie queria dizer. Foi um pensamento simples mas complexo, um pensamento que precisa ser analisado devagar. O que foi dado é uma nova perspectiva sobre viver a vida, e o que foi retirado é a ilusão da vida ilimitada e a crença em nossa singularidade pessoal nos isentando da lei natural. “