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Os velhos marinheiros

Autor

Jorge Amado

Editora

Martins

Tradução

Quincas Berro D'água dá sua risada

“... — Jararacas!
E, com a maior tranquilidade desse mundo, como se estivesse a realizar o
menor e mais banal dos atos, foi-se embora e não voltou.
Nisso, porém, não queria Vanda pensar. De novo regressou à infância, era
ainda ali que encontrava mais precisa a figura de Joaquim. Por exemplo, quando
ela, menina de cinco anos, de cabelos cacheados, e choro fácil, tivera aquele febrão
alarmante. Joaquim não abandonara o quarto, sentado junto ao leito da pequena
enferma, a tomar-lhe as mãos, a dar-lhe os remédios. Era um bom pai e um bom
esposo. Com essa última lembrança, Vanda sentiu-se suficientemente comovida e –
houvesse mais pessoas no velório – capaz de chorar um pouco, como é a obrigação
de uma boa filha.
Fisionomia melancólica, fitou o cadáver. Sapatos lustrosos, onde brilhava a
luz das velas, calça de vinco perfeito, paletó negro assentado, as mãos devotas

cruzadas no peito. Pousou os olhos no rosto barbeado. E levou um choque, o
primeiro.
Viu o sorriso. Sorriso cínico, imoral, de quem se divertia. O sorriso não havia
mudado, contra ele nada tinham obtido os especialistas da funerária. Também ela,
Vanda, esquecera de recomendar-lhes, de pedir uma fisionomia mais a caráter,
mais de acordo com a solenidade da morte. Continuara aquele sorriso de Quincas
Berro D'água e, diante desse sorriso de mofa e gozo, de que adiantavam sapatos
novos – novos em folha, enquanto o pobre Leonardo tinha de mandar botar, pela
vez, meia sola nos seus – de que adiantavam roupa negra, camisa alva, barba
feita, cabelo engomado, mãos postas em oração? Porque Quincas ria daquilo tudo,
um riso que se ia ampliando, alargando, que aos poucos ressoava na pocilga
imunda. Ria com os lábios e com os olhos, olhos a fitarem o monte de roupa suja e
remendada, esquecida num canto pelos homens da funerária. O sorriso de Quincas
Berro D'água.
E Vanda ouviu, as sílabas destacadas com nitidez insultante, no silêncio
fúnebre:
— Jararaca! ... “

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