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Cosmópolis
Autor
Don DeLillo
Editora
Companhia das Letras
Tradução
Paulo Henriques Brito
O dinheiro perde sua qualidade narrativa. A única coisa que importa é o preço que se paga. O próprio número em si
“... ”Queremos pensar na arte de ganhar dinheiro”, disse ela.
Estava sentada no banco de trás, o dele, a poltrona, ele olhava para ela e esperava.
“Em grego isso tem nome.”
Ele esperava.
“Chrimatistikós”, disse ela. “Mas temos de dar à palavra uma certa margem. Adaptá-la à atual situação. Porque o dinheiro sofreu uma mudança. Toda a riqueza virou seu próprio objeto. Toda riqueza enorme agora é assim. O dinheiro perdeu sua qualidade narrativa, tal como aconteceu com a pintura antes. O dinheiro agora fala sozinho.”
Ela normalmente usava uma boina, mas naquele dia estava de cabeça descoberta, Vija Kinski, uma mulher pequenina, usando uma camisa social com botões, um velho colete bordado e uma saia plissada comprida já lavada mil vezes, sua chefe de teoria, que chegara atrasada para a reunião semanal.
“E a propriedade também, é claro. O conceito de propriedade está mudando a cada dia, a cada hora. As fortunas que as pessoas gastam em terras, casas, iates, aviões. Isso não tem nada a ver com as tradicionais formas de autoafirmação, pois é. Propriedade não tem mais nenhuma ligação com poder, personalidade e autoridade. Nem com exibicionismo, vulgar ou de bom gosto. Porque não tem mais peso nem forma. A única coisa que importa é o preço que se paga. Você mesmo, Eric, pense só. O que é que você comprou por cento e quatro milhões de dólares? Não foram dezenas de cômodos, vistas incomparáveis, elevadores privados. Nem o quarto rotativo nem a cama computadorizada. Nem a piscina nem o tubarão. O espaço aéreo? Os sensores de controle e o software? Não, nem os espelhos que dizem como você se sente quando olha neles de manhã. Você gastou esse dinheiro pelo próprio número em si. Cento e quatro milhões. Foi isso que você comprou. E valeu a pena. O número se justifica por si só.” “