De frente para o sol
Autor
Julian Barnes
Editora
Rocco Digital
Tradução
Aulyde Soares Rodrigues
Modos de morrer na hora h
“... Como é que as pessoas morriam? Gregory pediu as últimas palavras das pessoas famosas. Os reis aparentemente morriam de dois modos. Gritando “vilão, vilão”, quando eram feridos pela faca assassina, ou arrumando os calções na expectativa confiante de logo entrar em outra corte que era muito parecida com a sua, embora um pouco – apenas um pouco maior. Os religiosos morriam piscando. Um olho voltado para baixo em obediência, o outro voltado para o alto, cheio de esperança. Os escritores morriam com frases literárias nos lábios, ainda desejando serem lembrados, ainda sem a certeza, até o último momento, de que todas as palavras que haviam escrito iam atingir esse objetivo. As palavras de uma poetisa africana foram: “Preciso entrar, a neblina está subindo.” Tudo bem, pensou Gregory, mas você precisava ter certeza do momento exato. Não podia dizer seu adeus cuidadosamente ensaiado e continuar vivo, a não ser que as últimas palavras registradas fossem: “Tragam-me outra bolsa de água quente.”
Aparentemente os artistas eram melhores nisso do que os escritores, pelo menos mais naturais. Ele admirava o desejo modesto do pintor francês: “Espero, de todo coração, que se possa pintar no céu.” Ou talvez os estrangeiros soubessem morrer melhor do que os anglo-saxões. Um pintor italiano, a quem aconselharam que chamasse um padre, respondeu: “Não, estou curioso para saber o que acontece no outro mundo aos que morrem em pecado.” Um médico suíço morreu medindo o próprio pulso e anunciando a um colega: “Meu amigo, a artéria para de bater.” Mortes profissionais como essas agradavam a Gregory. Simpatizava com o gramático francês que disse: “Je vas, ou je vais mourir, l’un ou l’autre se dit.” “
A definição de fracasso pós pensamento suicida
“... A maturidade não é resultado do tempo, mas do que aprendemos. O suicídio não era o único dilema filosófico real da nossa era, era uma tentadora irrelevância. O suicídio é inútil porque a vida é tão curta. A tragédia da vida é a sua brevidade, não o seu vazio. As nações estavam certas, pensou Gregory, proibindo o suicídio, porque o ato encorajava no seu expoente uma falsa noção de valores. O suicídio dava ao homem a impressão de autoimportância. Que terrível vaidade devia ser necessária para tirar a própria vida. O suicídio não era autoabnegação. Não dizia, sou tão miserável e sem importância que posso me destruir. Dizia o oposto, vejam, dizia, sou suficientemente importante para destruir.
Talvez tivesse pensado em suicídio por se considerar um fracasso. Sessenta anos e não tinha feito muita coisa. Morou com a mãe, morou sozinho, outra vez com a mãe. Mas quem dizia que isso era fracasso? Quem define o sucesso? O bem-sucedido, é claro. E se ele pode definir o sucesso então aqueles que considera fracassos deviam poder definir o fracasso. Desse modo, não sou um fracasso. Posso ser um homem quieto e fraco de 60 anos que nunca fez muita coisa, mas isso não faz de mim um fracasso. Nego suas categorias. Nos velhos tempos só havia as tribos errantes, que se acreditavam as únicas tribos da terra, e essa crença não foi abalada pelo aparecimento de outras tribos. Para Gregory as pessoas consideradas como sucessos na vida eram como essas tribos. “