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O professor do desejo

Autor

Philip Roth

Editora

Companhia das Letras

Tradução

Jorio Dauster

No entanto, não consigo deixá-la

“ ... Quando chegamos aos trinta anos, suas antipatias haviam se exacerbado tanto que cada um de nós se reduzira precisamente àquilo que o outro tanto suspeitara de início, o "cabotinismo" e a "afetação" professorais que Helen detesta em mim com todas as forças — "Você realmente conseguiu, David, virou um chato de galocha” —, não menos patente que sua "absoluta negligência", seu "esbanjamento idiota", suas "fantasias de adolescente" e outras coisas do gênero. No entanto, não consigo deixá-la, nem ela a mim, não até que o desastre total torne simplesmente ridícula a espera de uma conversão milagrosa do outro. Para nossa surpresa e de todos os demais, continuamos casados por quase tanto tempo quanto fomos amantes, talvez porque o casamento agora permite que cada qual ataque de frente o que julga ser seu próprio demônio (e que no começo parecia ser a salvação do outro!). Passam-se os meses e permanecemos juntos, nos perguntando se uma criança poderia resolver aquele louco impasse... ou uma loja de antiguidades para Helen... ou uma joalheria... ou psicoterapia para ambos. Muitas vezes nos ouvimos sendo descritos como um casal extraordinariamente atraente": bem-vestidos, viajados, inteligentes, cosmopolitas (sobretudo em comparação com outros casais de professores universitários), uma renda conjunta de doze mil dólares por ano... e a vida é simplesmente um inferno.”

Saber que a futilidade do que se está fazendo é a fonte mais profunda de satisfação

“... "Traduzo Moby Dick para o tcheco. Naturalmente, já existe uma tradução deste livro, aliás muito boa. Não há a menor necessidade de outra. Mas é uma coisa que sempre me interessou, e agora, como não tenho nada de urgente para fazer, por que não?"

“Por que esse livro? Por que Melville?", pergunto.

“Na década de cinquenta, passei um ano num programa de intercâmbio, morando em Nova York. Andando pelas ruas, eu achava que a cidade estava cheia de tripulantes do navio de Ahab. E no leme de tudo, grande ou pequeno, eu via outro trovejante Ahab. O apetite para pôr as coisas em ordem, para chegar na frente, para ser declarado campeão. E às custas não somente de energia e força de vontade, mas de uma enorme raiva. E isso, essa raiva, é o que eu gostaria de traduzir para o tcheco... se" — sorrindo — "isso for mesmo traduzível para o tcheco. Mas, como você pode imaginar, esse projeto ambicioso, quando terminado, será totalmente inútil por duas razões. Primeiro, porque não há a menor necessidade de outra tradução, sobretudo uma que será provavelmente inferior à ilustre versão que já temos; e, segundo, porque nenhuma tradução minha jamais será publicada neste país. Desse modo, veja você, sou capaz de me engajar num trabalho que de outra forma não ousaria enfrentar, sem ter de me preocupar de novo com a possibilidade de que ele seja sensato ou não. Na verdade, certas noites em que trabalho até tarde, a futilidade do que estou fazendo parece ser a minha fonte mais profunda de satisfação. Para você isso talvez soe apenas como uma espécie pretensiosa de capitulação, de autozombaria. Vez por outra sinto o mesmo. No entanto, continua a ser a coisa mais séria que consigo pensar em fazer na minha aposentadoria. E você", ele pergunta sempre muito afável, "o que tanto o atrai em Kafka?" ”

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